Peixe de Aquário

29 novembro 2006

dilúvios

aconteceu tanta coisa nos últimos dias, daria para fazer um livro de crônicas - que creio que seria o gênero mais adequado para contar as recentes histórias. bem, antes de tudo, retomo o que ocorreu antes da tempestade que inundou o CAI MAU e até alguns teatros no sábado, dia 25 de novembro.

Fui no Desconcertos na Pça. Roosevelt, organizado pelo Claudinei, assistir o Del (sai!, não tô virando tiete do cara não!), o Pierre Masato, que "saiu do armário enquanto poeta", Camilla Lopes, fantástica, que deu show, e a delicada atriz, Mariana Leme, que leu Sylvia Plath. Foi uma tarde muito especial, deixo um poema do Pierre para vocês lerem. A platéia atenta era composta de criaturas ótimas como a Carol Marossi de vestido de verão, o Bac, a Ana da Hora, o Victor del Franco (que acabou entrando na kombi para a leitura na Casa da Palavra), e tantos outros queridos ao redor de garrafas e copos de vidro.

Queria deixar aqui uma homenagem ao Claudinei Vieira, que tem tanto carinho com a produção contemporânea, e que irá organizar um evento de final de ano na Casas das Rosas no sábado, dia 2, com Nelson de Oliveira e tudo. Para quem não conhece o cara, ele escreve diariamente no Desconcertos.

Por fim, a leitura na Casa da Palavra foi ótima, em Santo André, muito legal mesmo - conversar com o povo da Cigarra e saber que a revista resiste e cada vez está mais bonita é bom. Acho que esses guetos são o que presta nesse nosso mundo de dilúvios e esquizofrenias. Depois posto as fotos.


alarmes

Pierre Masato

quando o prédio está em chamas
as sirenes gritam
como Rob Halford
luzes de emergência se acendem
automaticamente
não precisa correr
um bombeiro diz
displicente
no corredor enfumaçado

o fogo aqui não queima
ela de pijama
ursinhos carinhosos estampam
pó químico nas mãos
olhos vermelhos, remelas
o sorriso emoldurado
por baba espumosa branca
ela gritava
sonhei que o prédio estava em chamas
você me salvava
Rob Halford gritava

o fogo aqui gela
-
-

28 novembro 2006

mais poemas que adoro

.
.
..
................
Mattina

.................M’illumino
.................d’imenso



Giuseppe Ungaretti
.
.

o melhor verso: "meu ódio é o melhor de mim"

As coisas não vão bem por aqui, tac, tac, e decidi publicar meu poema predileto em língua portuguesa. E a vantagem de se ter um blog de poesia contemporânea & bobagens é que postar isso traz um estranhamento até necessário para que se pare e o leia inteiro.

Para quem se interessar, no Rasgada (livro de poesias) há um que dialoga com este: Ataque. leia aqui


A Flor e A Náusea


Preso à minha classe e a algumas roupas,
vou de branco pela rua cizenta.
Melancolias, mercadorias, espreitam-me.
Devo seguir até o enjôo?
Posso, sem armas, revoltar-me?

Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que triste são as coisas, consideradas em ênfase.

Vomitar este tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado.
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam pra casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.

Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves, que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.

Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.

Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.

Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens macias avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.

25 novembro 2006

O PAC nº 12 - Bolsa de Criação Literária

Daqui a pouco: o resultado na íntegra no Medianeiro.

Foi um anjo torto da Pça. Roosevelt que anunciou. Mas como na Pça. Roosevelt não há anjos, não podia tecer meus credos na previsão. Assim, foi uma semana bem chata, comprida, estressante e espera.

Hoje um outro tipo de anjo, desses bem mais advogados, ligou e disse: saiu no Diário Oficial! O mundo jurídico reconheceu a previsão e fez-se em dinheiro – sou finalista do PAC nº 12, Bolsa de Criação Literária!!!


Bolo Pudim

Ingredientes:

Para o bolo:
210 grs. de açúcar
2,5 dl de leite morno
240 grs. de farinha de trigo
4 ovos
1 colher de sobremesa de fermento em pó

Para o pudim:
5 ovos
1 lata de leite condensado
1 lata de leite gordo
2 colheres de sobremesa de coco ralado

Para o caramelo:
2 xícaras de chá de açúcar
1 xícara de chá de água
Confecção:

Faça o caramelo: numa frigideira, junte o açúcar e a água, mexa para misturar. Deixe ferver não mexendo mais até que comece a caramelizar. Forre como caramelo ainda quente uma forma redonda com buraco. O pudim: Misture bem o leite gordo, leite condensado e o coco ralado. Adicione os ovos um a um batendo bem entre cada adição. Ponha a mistura na forma. O bolo: Bata muito bem o açúcar com as gemas. Adicione o leite morno, mexa. Junte a farinha misturada com o fermento misturando bem. Bata as claras em castelo junte ao prepara envolvendo bem sem bater. Ponha a massa com cuidado sobre o pudim. Leve a cozer em banho-maria cerca de + ou - 50 minutos, mas convém verificar. Depois de cozido deixe arrefecer um pouco e desenforme.

Rompendo o Silêncio com Marcelo Montenegro

Na terça-feira passada, houve novamente mais uma etapa do Rompendo o Silêncio, projeto que a Casa das Rosas toca com o Antonio Vicente, prof. da USP, a respeito de poetas contemporânes.
A noite foi muito agradével com o Marcelo Montenegro e quem ainda não leu Orfanato Portátil está perdendo muita coisa.




23 novembro 2006

um poema de Dirceu Villa

O mau humor ia deixar o Peixe sem poemas, mas depois de um e-mail que recebi hoje, a tal verdade “a vida é mais forte” deixa sua marca.

Como reação, procurei um poema delicado. Tenho um certo prazer em datilografar poemas, é uma outra forma de ler com os dedos, porém as circunstâncias ditaram um copy-paste mesmo, lá do Germina. clique aqui

O poema é daqueles autores que adoro e leio antes de dormir, o Dirceu Villa. E como rasgação de seda pouca é bobagem, por sinal também é o mais charmoso poeta dessas paragens, e como comentei lá no escolhas afectivas (espero que o comentário seja aprovado, vai saber, eles andam quentes por lá), se nomeasse “o mais belo” iria ocorrer uma guerra? Hum, interessante.

Aí vai.


Cosméticos para o Corpo
toilette feminina


Que perfume prefiro
esta noite?
resina, madeira,
o dulçor de um floral?

Linha negra de lápis
nos olhos?
brilho no peito,
e batom no meu beijo?

Na banheira eu me deito,
cabelos num coque;
com sais odorosos
me lavo:

O que eu passo na pele,
e no rosto?
karité, alfazema,
hidratante?

Oh deusa, meus dedos
me tocam entre as pernas,
e abrigo o amor
num suspiro.


Dirceu Villa é poeta e mestre em literatura pela USP. Publicou MCMXCVIII (Badaró, 1998) e Descort (Hedra, 2003), ambos de poesia.

22 novembro 2006

Lugar Comum 20: Geografia de Los Angeles

......meu avô morreu
......highways atropelam minhas pernas curtas.



foi com o Altman que descobri que LA não tinha calçadas. Espero que o poupem de encontrar o Friedman em outros ares.
.

20 novembro 2006

novo layout do peixe

o que não se faz nesses feriados...
(hoje fui ver o Marcelino e a Fabiana Cozza, uma coisa, lá no Sesc Vila Mariana - os dois descalços, ela com colares com ares de serpentes tiradas dos cabelos de medusa que paralisam a platéia, congelam os maus pensamentos e botam todo mundo para dançar. que mulher. coisa linda: cantos negreiros).





19 novembro 2006

Santiago nas Letras e Fotos da Eloisa Cartonera


A foto mostra o Del Candeias, o Santiago Nazarian e o Antonio Vicente lá na FFLCH chamado O Escritor nas Letras, organizado pelo Welder do CAEL. Apesar de ter saído cinderelística, sei que as coisas foram legais.
O Santiago Nazarian, o convidado do encontro, é autor de quatro romances. Falei rapidinho sobre A Morte sem Nome, todo construído em discurso indireto livre, com uma personagem central, Lorena (que a todo tempo trocam seu nome por Letícia), cuja vida é se suicidar o tempo inteiro – cada vez que encontra uma dificuldade, se mata. O cara sabe construir muito bem a personagem feminina e infelizmente a Lorena é sempre parecida com alguma amiga tua, pode conferir.

Há uma tensão sexual bem marcada em vários suicídios, li por lá uma em que a Lorena é atropelada por um ônibus e adora que ele entre assim firme no carro, sem parar. As cores do romance são bem definidas em três nuances: o vermelho, o preto e o branco cinzento, o que se reflete na capa que o Santiago contou que é uma ilustração de seu pai (linda!). Fica a dica.

E ontem teve a despedida do stand da Eloísa Cartonera na Bienal. Mais tarde escreverei sobre o livro do Cristian e dos brasileños lá lançados veja no site da Elisa. E sem milongas pq esses argentinos voltarão em breve (espero de coração!).
Fotos da Sissy Eiko aqui e as minhas aqui

17 novembro 2006

DOCES ENJOATIVOS - blog de del candeias e ana rüsche!


Inaugurado!

O DOCES ENJOATIVOS é o novo blog do Del Candeias e dessa que te escreve:

http://docesenjoativos.blogspot.com.

A foto do layout é do Diego Carrera, meu predileto (aliás, quem quiser divulgar flickr e cia, diz aí). O assunto é tudo. No momento, o Del discute amor e a pegação com base na frase de Machado na boca do Dr. Batista em Ressureição "a paciência é a gazua do amor".

Não perca!

15 novembro 2006

Flores, automóveis e estrelas cadentes

foto: bancas de flores na dr. arnaldo.


Conheci a Josiane Bosqueiro na Balada Literária, sim, naquela muvuca toda. Ficamos de trocar livros, essa forma tão bonita de se dizer “muito prazer” a um escritor. Li o seu Jardim de Noites e faz tempo que quero publicar um poema dela aqui, uma lírica delicada que faz falta nesses cenários contemporâneos. Deixo para você o nº IV da série Noturnos.

IV

Uns goles e me deito. Então
noite, uísque, chão
Penso:
Flores caíram sobre o teto apressado do carro
e com tanta vontade e pressa
as estrelas cadentes quiseram viajar de
carona
apressadas que são, como o automóvel
as auto-florzinhas-móveis

que pintaram sem querer

borrões de uma Noite Estrelada
um quê de Van Gogh
ao pincel do velocímetro.

Só vá ao Museu se chover!


Foto: intervenção de Alessandra Cestac. Reportagem da Folha sobre o trabalho dela aqui

Em épocas de confinamento em massa com bienais, mostras (e principalmente pq São Pedro em sua orgia com Tupã, Thor e Iansã não decide se a gente deve usar regata ou 4 casacos), conheci ontem por tramóias da vida o pessoal que organiza o EIA – Experiência Imersiva Ambiental, eventão que ocorrerá de 2 a 10 de dezembro em São Paulo.

Creio que uma leiga como eu poderia os definir como artistas plásticos que preferem atuar em espaços públicos, em lugar de se fecharem em galerias (para a nossa sorte!), no brado claro: Ruas, um espaço possível! E antes que alguém pense que são “depredadores” e outros rótulos terríveis, são um povo muito consciente da necessidade da arte interagir dentro da cidade e com seus habitantes, o que pode ser visto no Flickr da Alessandra Cestac. Gostei muito do que ouvi por lá. Um trecho do blog deles:

“Durante os dias da experiência, os participantes formam um grupo que age na cidade. A força desse coletivo inicia-se nos meses que antecedem o encontro por meio das discussões no blog e do Ciclo de Debates. Essas reuniões prévias possibilitam a formação de uma inteligência híbrida, criada dentro das relações de trabalho, festa, descontração e contestação, que contribui para aumentar o potencial transformador das ações”. ler na íntegra


E quem quiser se inscrever, ainda há tempo! Performistas, poetas visuais e outros afins, aproveitem! leia o edital aqui

Pensei que alguma intervenção do EIA poderia ser na Pça. Roosevelt... tramando dentro daquela noção louca do Ivam que a praça tem que virar um pólo que uma várias linguagens, vai vendo onde isso vai chegar... hehe.

Links: Blog do EIA - Mapeia e Comunidade no Orkut

14 novembro 2006

De uma crítica publicada num suplemento cultural de domingo

Em épocas que cada vez se discute a validade da "estética da fome para exportação" no cinema e, ao mesmo tempo, a necessidade da arte não se abster de certas realidades, o poema do Paulo vem como um soco no estômago de filhos de banqueiro que curtem vender produtos de cultura caros sobre a miséria.

(Como já foi dito por aí, o Ferréz e o Sérgio Vaz tinham que lançar a revista Morumbi...)


O melhor do poema é que foi publicado faz um tempo no Caderno Mais da Folha - metalinguagem e ironias da vida não são meras coincidências, hehe. Aí vai:


De uma crítica publicada num suplemento cultural de domingo

I. (o artista : um retrato)

A estréia de J.G.C. aos
32 anos, na quinta-
feira, é a certidão de nasci-
mento de um artista em dia com as
demandas de nosso tempo.
Tendo, nos últimos 12
se dedicado a oficinas,
cursos, viagens e visitas
a exposições, sua obra pôde es-
perar o momento certo
para eclodir, não sofrendo
da habitual ingenuidade
que caracteriza todos
os dublês de Duchamp, pois o
seu domínio sobre o espaço e
sobre a matéria é absoluto,
bem como sua força suges-
tiva, tanto que estimula
sensações inexistentes
em um público pouco ou nada
familiarizado com a
realidade que retrata.

II. (o artista : depoimento)

Estudei dos 20 aos 30
na Europa, tempo de intenso a-
prendizado, mas só conto os
dois anos depois da volta, es-
senciais para a concreção do
meu estilo, pois passei longos
meses nas ruas e favelas,
freqüentei cortiço, abrigo e
bueiro, conheço essa gente
pelos nomes, inclusive
seus cachorros, cheguei mesmo a
me sentir igual a eles.

III (a obra : o conceito)

Foi essa bizarra experiência
que lhe permitiu trazer à
galeria sacos e sacos
de latinhas de alumínio,
pilhas de papelão (os quais o
público pode tocar) e
duas carroças que estão livres
para quem quiser puxá-las.
A cena é um divertimento à
parte: há muito riso, já que
nem sempre os músculos das a-
cademias são aptos para
vencer os quilos de entulho. As
demais obras aprofundam-
se nesse universo excluído:
bancos (camas) de concreto
salpicados de excrementos,
panos puídos pendurados,
secando ao sol (um holofote) --
fachos que atravessam os furos
criam uma trama no espaço
--, cobertores embebidos
em querosene na espera
de um fósforo e, o principal, um
barraco inteiro, legítimo,
no qual entram dez pessoas de
cada vez. Lá: colchões velhos,
recortes tampando as frinchas
das paredes (o olho atento a-
qui diferencia as texturas
de cada, das tantas, tábua),
panelas com restos pelos
cantos e roupas imundas --
tudo bastante insalubre. A
visita não dura mais que
dois minutos, e é tão real que
na estréia alguns vomitaram.
J.G.C esperava o
vômito de quem, como ele,
não sabe o que é o inabitável.


IV (nota final)

Os antigos moradores
foram com justiça pagos
pelo barraco e por tudo
que eles tinham, inclusive as
roupas, podendo a família
toda regressar ao mato
do qual os coitados nunca
deviam ter posto o pé fora.
Se você ficou curioso,
mas crê que toda a sujeira
pode te macular, saiba
que os monitores do evento
num átimo providenciam a
completa assepsia de todos
logo que se sai da sala.


(ah, o vinho era de ótima safra)



de Paulo Ferraz

E HOJE: Lançamento do Alessandro Buzo, romance Guerreira. Na Ação Educativa (19hs) Rua General Jardim, 660 - Centro - São Paulo-SP. Detalhes no blog do autor, Suburbano Convicto.


13 novembro 2006

Feito Adão de manhãzinha

[NO PAPEL DE RASCUNHO: consta um poema meu hoje. O blog é da Virna Teixeira e podem marcar nos favoritos que sempre há poemas e traduções interessantes, eu mesma passo por lá todos os dias].

E blog é um troço que sempre suscita conversas. Publiquei o "poema que adoro" do Walt Whitman abaixo e disse que gostava dele assim, em inglês, simples e difícil ("a recriação gay da Criação"). O Marcelo Sahea comentou a postagem com uma tradução de um amigo, Ramsés Ramos (1962-1998) - achei boas as soluções. Aí vai para melhorar a segundona.



As Adam early in the morning

As Adam early in the morning,
Walking forth from the bower refresh’d with sleep,
Behold me where I pass, hear my voice, approach,
Touch me, touch the palm of your hand to my body as I pass,
Be not afraid of my body.



...Feito Adão de manhãzinha

... Feito Adão de manhãzinha
... Abrindo veredas refrescado pelo sono,
... Quando eu passar, por favor, ouça, venha,
... Toque-me, pouse a palma da mão em meu corpo
... - Não tenha medo do meu corpo.


Tradução de Ramsés Ramos
WHITMAN, Walt. Folhas da Relva / Leaves of Grass. Tradução e seleção de Ramsés Ramos. Brasília: Plano Editora: Oficina Editorial do Instituto de Letras UnB, 2001.

11 novembro 2006

Linton Kwesi Johnson e a Dub Poetry

Xenofobia é um lugar comum e até meio banalizado. Mas o que trouxe hoje creio que não é: tive uma aula sobre Poesia Caribenha, Black British e os movimentos de resistência poética contra o tatcherismo. Conforme declaração proferida pela própria Margaret Tatcher em 20 de fevereiro de 1978 sobre imigração:

Mrs. Thatcher called for a "clear end to immigration," on the ground that "people are really rather afraid that this country might be swamped by people of a different culture. And, you know, the British character has done so much for democracy, for law, and done so much throughout the world, that if there is any fear that it might be swamped, people are going to react and be rather hostile to those coming in."

(e qualquer semelhança com os dias de hoje é mera coincidência).
Link para o artigo da Time:
Mrs. Thatcher's Bold Gamble leia aqui

Um exemplo lindo dessa resistência é Linton Kwesi Johnson, um poeta caribenho que morou na Inglaterra. Nasceu em 1972 na Jamaica, imigrou para Londres em 1963 e desenvolveu a dub poetry, poesia cuja escrita fonética é baseada na dicção do crioulo e há trechos inteiros em rap. E para quem precisa de um ingrediente canônico para acreditar que "isso é poesia", lá vai: Kwesi Johnson foi o segundo poeta vivo a ser publicado na série Penguin Classics – título, Mi Revalueshanary Fren.

O melhor, no entanto, é ver a maneira de se declamar esse tipo de poema. No Youtube encontrei um link com o poema abaixo, filmagem retirada da BBC. Ótimo para desejar o bom final de semana.


It Dread Inna Inglan


Dem frame up George Lindo up in Bradford town
but de Bradford blaks dem a rally round
me seh dem frame up George Lindo up in Bradford town
but de Bradford blaks dem a rally round

Maggi Tatcha on di go
wid a racist show
but a she haffi go
kaw,
rite now,
African
Asian
West Indian
anÂ' Black British
stan firm inna Inglan
inna disya time yah.

Far noh mattah wat dey say,
come wat may,
we are here to stay
inna Inglan
inna disya time yah...

George Lindo - im is a workin man
George Lindo - im is a famili man
George Lindo - he never do no wrong
George Lindo - di innocent wan
George Lindo - im nuh carri do dagger
George Lindo - im is not no robber
George Lindo - dem haffi let im goh
George Lindo - dem betta free im now !

Ilustração: retirada da Wikipédia, trata-se de capa de CD lançado em 1991: http://www.lyricsdownload.com/album-B000003QIN.html

10 novembro 2006

SUPERCOISA 00 - 26 de novembro de 2006

A SUPERCOISA 00 será no dia 26 de novembro de 2006 - domingo. Casa das Rosas, começa às 10h, termina quando acabar (ou quando nós nos acabarmos).

O que é a SUPERCOISA? Difícil explicar, mas é simples de se pegar o espírito: um dos motivos de organizarmos esse eventão é reunirmos uma galera, escritores novos, que poderiam se ver mais vezes e discutir sua própria produção. Aí pensamos em várias COISAS que provoquem assuntos a ver, mas não no formato palestra, algo mais circular, includente, com várias pessoas para animar debates, com oficinas e com leituras uns dos outros. O rascunho da programação está também no blog, talvez aí fique mais claro o que quero dizer (ou não). Agora se dará certo, já não sei: depende de nós todos, incluindo você.

O nome do troço zoa com esse lance "geracional", pois parece que escritor agora tem prazo de validade de 10 anos. E nós somos ainda os zerados, após a metade de nossa "vida útil" da carreira. E o super aí foi no brainstorming mesmo, pois bobagem nunca pode faltar em evento literário. Mas quem se leva a sério também está convidado.

Ajudem a divulgar, por gentileza. A SUPERCOISA agradece.

supercoisa

Ps.: Quem quiser ajudar e divulgar o banner que a linda Dona Faleiros fez, tem dica do Taddei no blog da SUPERCOISA.

09 novembro 2006

sobre o Muro de Tordesilhas

foto: Diego Carrera, as usual.
Continuando o papo todo, sobre a necessidade (que virará tendência irreversível, te prometo porque aqui é assim) de estudar literaturas cuja dicção se aproxime mais da nossa, como as africanas de língua portuguesa e as latino-americanas, no Portal Literal consta um artigo bem legal da Camila do Valle sobre a produção da geração zerada argentina. leia aqui

A idéia do texto da Camila, mais do que ditar as bobagens do “bom” ou o “ruim” ou o “grande nome” desse povo novo – aliás, a única atitude razoável ao se redigir um texto desse – é contar um pouco como vivem, do que falam, como os encontrar. Ela completa o texto com poemas e suas traduções.

De minha parte, fiquei muito impressionada com uns poemas do Cristian de Nápoli, meu querido vizinho argentino de antologia Oitavas, Selo Demônio Negro. Em resposta, redigi esse daqui, que não está assim tão pronto, mas você me ajudar a pensarmos juntos:



O Boato


o muro ruiu

mas construiram outro em seu lugar
poucas léguas do que se pasa em el paso


o muro ruiu

e no checkpoint charlie
(que já dividiu amantes, alemanhas e a velha
bibliotecária de seus livros, de seus gatos),
hoje se inunda de caranguejinhos com olhos de tigre
a tirar fotografias como numa fila de banco

o muro ruiu

exatamente onde tatuaram a rosa de ontem.
uma rosa, um machucado, frincha de fresta entre frestas.
e o el muro de tordesilhas ruiu pelos pampas
já que cataratas e dilúvios não sabem ler e
soterram a lei da gravidade.

o muro ruiu

tudo isso é boato,
o resto é futuro.



08 novembro 2006

práticas bissexuais e o uso das consoantes

ao Picchi


....fado
.......é tudo que ela canta por meu corpo

....falo
.......é a parte com que ele escuta meus teatros

....faro
.......é o que me resta pelas noites dúbias
.
.
.
.
ONTEM: Lançamento de Papel Manteiga para Embrulhar Segredos, da Cristiane Lisbôa com receitas da Tatiana Damberg (linda), foi fino: animado, com pessoas ótimas, em sintonia para conversar... nada dessa pose para ganhar o Jabuti! - mais detalhes sobre essa "pose" em prescrições de Andrea Del Fuego num conto de auto-ajuda para escritores em busca da imortalidade. Há. (Pior que fica dúbio que nem na noite acima, pq o Marcelino estava por lá. Hum... será que é assim que se ganha mesmo?).Que venham outros lançamentos assim! E, Laerte, adorei te conhecer.

Ps.: Editei o título de hoje de manhã - não sei se melhorou. O lance do 'fado' não estava sendo sacado. Antes estava "o amor no uso das consoantes". Diga aí.

06 novembro 2006

Anotações Críticas


Após ligações desesperadas e cartas ameaçando suicídio ante minha última postagem supostamente "séria", aí vão anotações críticas sobre as Satyrianas, uma reflexão coletiva fruto de muitas mãos e copos durante o feriado.


O Melhor das Satyrianas

- A Branca de Neve!
- O Altivo é Tempo de Guerra.
- A Dança Séria.
- Assistir Inocência.
- A pergunta que não quer calar: a UOL entrevistou o Gerald Thomas e entrevistará o Bactéria. Quem será o terceiro?
- Poemas da Lílian Aquino pela manhã.
- O sorriso da Dona Faleiros.
- A pinga Corisco (pronuncia-se “Corischco”) vinda de Paraty, apresentada pelo Berimba, resquícios da FLIP? E viva o traquejo aprendido com o Ponce e com Jarchdim no carioquêis.
- Conhecer pessoalmente o Roberto Taddei e o apresentar mais de 4 vezes para os Ursos sob efeito de Corischco...
- “É difícil ser homem hoje em dia” – reflexão de Eduardo Lacerda ante certos fatos inegáveis da pós-modernidade.
- A reflexão sobre o silêncio e a poesia contemporânea puxada pela Virna Teixeira.
- Falar português com o Cristian de Nápoli como se ele já fosse um dos Maloqueiristas e tivesse bebido Corischo.
- Paparazziar com o Fabio Snoop.
- Ouvir o “eu e o outro” lado da historinha poetas versus prosadores
- Lições de auto-ajuda de Andréa Del Fuego sobre “Como ganhar o Jabuti”
- Descrição do bumbum-bombons de Ronaldinho pela Ivana (impagável!).
- O cachimbo do Claudinei Vieira.
- A doce canção entoada nos Parlapatões: ser gay ou ser advogado?
- A cara pacífica do Del ao ouvir que sua camiseta com o Marlyn Mason agredia alguém.
- Ouvir as histórias sobre jogos e vícios de Del Candeiras.
- Tomar cerveja na tarde com sol a pino, enquanto a incansável oficina do Rodolfo Vázquez circula pelos arredores da praça.
- Conhecer pessoalmente o Tavinho Paes e o Leprevost.
- Receber 350 ligações no celular do Eduardo – claro que era o Fabio Alface, quem mais?
- A cada 3 horas ver o Chacal em algum lugar.
- Ganhar presente de aniversário e abraço do Dirceu Villa.
- Saber histórias do Pedro, filho da Pilar.
- Gritar “Quatis!” ao ver a Julia e o Caqui.
- Constar na agenda social do Alitto.
- Durante a reunião do Supercoisa 00, filosofar sobre o caráter flutuante da névoa de gordura no bar em que estávamos.
- Poemas sobre a vida íntima de Camila, a musa. Ou alguém achou que seria diferente?
- Ouvir o Sérgio Mello recitar o lindo verso "a melancolia é um vestido de noite/ usado de dia", ante a própria condição de comparecer no Poesia ao Entardecer (17h) e Café Literário (10h) com o mesmo figurino. Mera coincidência.
- Rever a Dani Ramos bem, após acidente que nem sabia que ocorrera – seqüência de vôos?
- Escutar mais de 300 vezes a mesma história do Gegê da menina que usou João Cabral como guia de viagem ao conhecer Pernambuco.
- Contar mais de 300 vezes a mesma história ao Gegê sobre a Corischco imitando o povo da Bagatelasch.
- Ganhar A Grande Incógnita e autógrafo do Ivan Hegenberg.
- Imaginar um ninho entre as mãos que acendem um cigarro por culpa do Heitor Ferraz.
- Ser chamada de delícia pela Branca de Neve.
- Dormir sono repousante com os Ursos.
- Vocês todos que eu adoro.

Satyrianas: 1 poema, agradecimentos e fotos

Quem quiser ler mais sobre as Satyrianas, leia nos blogs do Ivam e do Rodolfo

Pensei muito no que iria escrever hoje neste post. Li que foram 3 mil pessoas lá no sábado. Após uma segunda-feira quente de trabalho e 2 tylenois 750mg, descobri que bastam um poema e agradecimentos. E fotos de criaturas maravilhosas que vocês podem ver aqui - como essa da Dona Faleiros, dama que entardece a própria tarde.

O poema é do Sérgio Mello, que conheci por sugestão da organização ou por culpa de Plutão que lá deve ter ainda sua influência sobre os humanos (– tudo bem que o cara me decepcionou ao desistir de ver despida sua poesia sob o palco, mas vá lá. Ademir, você não está muito melhor na fita, hehe). O Sérgio é dono de um verso lindo: “a melancolia é um vestido de noite/ usado de dia”. Foi difícil escolher qual de tantos poemas e contos iria trazer para vocês, minha cabeça está cheia de palavras de noites acordadas, espero que gostem.

Os agradecimentos vão para os escritores que compareceram (que também muitas vezes se estenderam e se excederam) nas Satyrianas:

Antonio Vicente Pietroforte, Del Candeias, Paulo Ferraz, Fabio Aristimunho, Heitor Ferraz, Lilian Aquino, Ivana Arruda Leite, Victor del Franco, Marcelo Montenegro, Ademir Assunção, Eduardo Lacerda, Sérgio Mello, Claudinei Vieira, Dona Faleiros, Cristian de Nápoli, Dirceu Villa e a querida Virna Teixeira.

Também queria agradecer aos amigos loucos de sempre a companhia pelas madrugadas, pelas tardes e pelas manhãs (sim, às 10h para o café da manhã de hotel!). Especialmente ao Altivo, que participou do ápice bizarro disso tudo. A Carol sabe. Ivam, Rodolfo e queridos todos da Roosevelt, vocês arrasaram!



Retóricas

alguém falava de sustos
e névoas
e longas mijadas
em banheiros de postos de gasolina
de esquecer de devolver as chaves pro frentista
alguém falava do calor humano
que tem estufas de padaria
de acordar com vozes demoníacas no ouvido
e depois de quão confortante é descobrir
que havia dormido com um walkman
de pilhas fracas
alguém falava de petardos na boca
do aniversariante
vizinhos batendo com um cabo de vassoura
no assoalho do quarto
de algo parecido com drops solidários
oferecidos em faróis fechados
alguém falava de mulheres que sabem acordar com jazz
aos domingos
e do perfume que bicicletas velhas
exalam sempre depois das chuvas




02 novembro 2006

pop latino é deliciosamente destruidor quando se corta a madrugada nisso. por conta da destruição, deixarei o walt whitman com essa cara ainda uns 3 dias pregado aí. agora, só mesmo na pça. roosevelt e no Congresso Mundial de Salsa do Brasil. juro que existe e estarei lá, clica aqui
ps.: encontrei o blog do Rodolfo García Vázquez que fala um pouco de Inocência, peça em cartaz lá nos Satyros.

01 novembro 2006

poema que adoro


Acho esse um dos poemas mais bonitos que conheço. E gosto assim, em inglês, simples e difícil. A recriação gay da Criação (desculpe se antecipo a interpretação, mas é manjada).
Em ritmo de Satyrianas, aos meus amigos que adoro tanto que discutem maneiras de recitar um carvalho a crescer - podem imaginar sempre o pior. Para essa quarta-sexta-feira, Walt Whitman em gravura impagável retirada da Wikipédia:




As Adam Early in the Morning



As Adam early in the morning,

Walking forth from the bower refresh’d with sleep,

Behold me where I pass, hear my voice, approach,

Touch me, touch the palm of your hand to my body as I pass,

Be not afraid of my body.
..
..